segunda-feira, 6 de abril de 2009

Ouve-me agora

Eu gostava de uma resposta,
de atenção
Ouve-me coração!
Ignora quem não te chama
Desiste, que não te ama
Por favor ouve-me que sou a tua razão

Não cedas,
Não desta vez ...
Não faças de orelhas moucas a todos os meus porquês
Não sentes a dor?
Por favor ouve-me que sou a tua razão

Amanhã tudo estará bom para ti,
coração
Tu sabes que não,
que és tu a brincar feito ilusão
Ouve-me quando grito
Porque sou eu a tua razão

Não sejas mesquinho
mentiroso, coração
Farto estas de ser bondoso
Serei eu sempre a voz da razão
por isso ouve-me. Não!
Não sejas louco
Não sejas doente
Porque essa gente te mente
te prende
E tu coração,
porque lhes das sempre o perdão?
Oiço-te agora porque não tenho uma razão

Vê nessa bravura

O ódio
A dor
A fé no amor
A espera, o ardor
O pódio perdedor

Ser humano
Ser mundano,
banal e leviano
Ter na raiva
uma bravura
Que na garganta vem a secura
na hora de amar
alguém

quinta-feira, 12 de março de 2009

Delimitações

Não
é palavra de limite
É palavra que se espera do medo.
É o sonho do fraco que se cria
e que se afoga cedo,
quando a aurora tenta trazer
a alma que o positivo inventa

segunda-feira, 2 de março de 2009

Svengali - Dedos

"A chuva incessante
sobre a tua cabeça
A chuva
Não digas nada
Ouves?
Se chegarem ao destino, 
logo as palavras encontrarão a lua,
a lua do deserto,
a lua das florestas,
a lua do mar,
a mesma que nocturnamente nos tem seguido desde sempre
primeiro com pena
depois com estranheza,
depois com empenho,
depois com enfado
As palavras ficarão ali em frente à lua
Descansando
(...)"

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Poeta do Frio

O poeta do frio
com as suas palavras de um canto obscuro
Regela, de tão frias as suas palavras
com cheiro a bafio

O poeta do frio ..
Esse! Que já não sentia
Chorando pela louca dormência
que se tinha abatido nele depois do Estio

O poeta do frio
que já fora alguém outrora,
onde o calor fervia no seu coração
doce rebelde, inspirado e gentio

O frio passou pelo poeta,
deixando o ainda só poeta do frio
na melâncolia febril do nada sentir

8 Janeiro

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

O Bom, O Mau e O Sonhador

Tinha um sonho
quando era criança
Ingénuo sonho de infância,
sem acordar medronho

Minha mãe sempre me disse
para ser bom
Os bons são compensados
Os maus são afastados
Minha mãe disse-me para não
sonhar muito

Não teve um caminho fortuito
Diz-me que sonhou em vão
Diz-me que os sonhos são
coisas muito vagas na nossa cabeça
Nem sempre queremos mesmo os nossos sonhos
Medo de que o sonho transpareça
para sempre na nossa realidade

Insistia para que rezasse
Os bons rezam e os bons se sacrificam
"Se rezares o Senhor salva-te"
Os maus entre os maus ficam
Então, minha mãe,
Rezar não é acreditar e acreditar não é sonhar?
"Sonhar é sem vintém!
Quem sonha são os loucos ...
os bons têm fé"

Tão que foram os meus ouvidos moucos
que o meu sonho de infância
ainda sonha de pé
Os maus também não sonham
Os maus conspiram na inveja
dos sonhos dos outros
Vivem colhendo a fé que sobeja dos bons

Por isso, minha mãe,
no fim
escolhi ser louco,
que o bom e o mau têm muito pouco
sono para poder adormecer
Sonho para poder acordar


03 Janeiro

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Bartolomeu Sozinho

"Aos 10 anos todos nos dizem que somos espertos, mas que nos faltam ideias próprias.Aos 20 anos dizem que somos muito espertos, mas que não venhamos com ideias. Aos 30 anos pensamos que ninguém mais tem ideias. Aos 40 anos achamos que as ideias dos outros são todas nossas. Aos 50 pensamos com suficiente sabedoria para já não ter ideias. Aos 60 ainda temos ideias mas esquecemos do que estávamos a pensar.Aos 70 só pensar já nos faz dormir.Aos 80 só pensamos quando dormimos."

in Venenos de Deus, Remédios do Diabo de Mia Couto